Confinamento obrigatório - Habeas Corpus TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DOS AÇORES PRESIDÊNCIA = Comunicado de Imprensa = -(Habeas corpus) - 16Maio2020 Esta manhã a Senhora juiz de instrução criminal de Ponta Delgada apreciou, medianteprovidência extr...
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Confinamento obrigatório - Habeas Corpus
TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DOS AÇORES
PRESIDÊNCIA
= Comunicado de Imprensa = -(Habeas corpus) - 16Maio2020
Esta manhã a Senhora juiz de instrução criminal de Ponta Delgada apreciou, mediante
providência extraordinária conhecida como “habeas corpus”, prevista no art. 31.o da Constituição
da República (CR), pedido de restituição à liberdade de cidadão proveniente do território
continental que se encontrava em confinamento profilático numa unidade hoteleira da cidade,
após aí ter sido conduzido com escolta policial e por determinação das autoridades de saúde. Em
tal decisão considerou a Senhora juiz, e em síntese apertada, que:
a) A situação em causa era de privação da liberdade, entre outras razões, por nela não
concorrer o consentimento do visado, decorrer em local confinado e sob vigilância
policial, sendo que tal privação da liberdade, fora de estado de emergência, não tem
título no artigo 27.o/1/3 da CR, o que implica inconstitucionalidade material dos
normativos que a autorizam.
b) A restrição desse ou outros direitos fundamentais é matéria da competência de dois
órgãos de soberania, a Assembleia da República ou do Governo da República, e este
se autorizado por aquela, quedando assim fora do âmbito de competências dos órgãos
próprios das Regiões Autónomas, nos termos conjugados dos artigos 18.o/2, 110.o,
165.o/1/b, 225.o/3 e 227.o da CR, o que implica inconstitucionalidade orgânica dos
normativos que a autorizam.
c) Mesmo que não se verificasse a antes referida inconstitucionalidade orgânica, o
confinamento compulsivo de pessoa sem estar infectada, e sobre o qual não recaia
fundada suspeita de infecção, sem ponderação entre os valores da saúde pública (um
bem difuso) e da liberdade pessoal (bem individual) e ainda sem a possibilidade fazê-
lo no domicílio, tendo ainda em conta que pessoas positivamente infectadas fazem aí
o seu tratamento, viola os princípios da proporcionalidade, respectivamente, na
dimensão da proibição do excesso e da necessidade, consignado no artigo 18.o/2 da
CR, o que implica inconstitucionalidade material dos normativos que a autorizam.
d) Mesmo que não se verificasse a acima referida inconstitucionalidade orgânica, a
circunstância de estando declarada a calamidade pública em todo o território nacional,
qualquer cidadão nacional possa livremente desembarcar em qualquer aeroporto do
continente, mas na Região Autónoma dos Açores ser privado da liberdade,
acrescendo que os residentes não custeiam, mas os não residentes custeiam, o
confinamento compulsivo, como no caso do requerente, viola o princípio da
igualdade previsto no artigo 13.o da CR, conjugado com o artigo 18.o do mesmo
diploma, o que implica inconstitucionalidade material dos normativos que a
autorizam.
e) Mesmo que não se verificasse a acima referida inconstitucionalidade orgânica,
nenhum dos diplomas normativos em que se sustenta o confinamento obrigatório
prevê informação à pessoa privada da liberdade dos direitos e mecanismos legais de
reacção à privação da liberdade e nem a validação ordinária por banda de um tribunal,
em razão do que ocorre violação do artigo 27.o/4 e 20.o/5 da CR, o que implica
inconstitucionalidade material dos normativos que a autorizam.
Diante do descrito a Senhora juiz de instrução criminal desaplicou, nos termos do artigo 204.o da
CR, os artigos 9.o, 10.o, 11.o e 12.o do Decreto Legislativo Regional 26/2019, de 22 de Novembro,
os pontos 3, alínea e), e 11 da Resolução do Conselho do Governo n.o 123/2020, também na parte
em que remete para a Resolução do Conselho do Governo n.o 77/2020, por desconformidade com
os artigos 1.o, 13.o, 18.o, 20.o, 27.o, 165.o/1/b, 225.o/3, 227.o/1/b e 228.o da CR, declarando
procedente a providência de habeas corpus e restituindo o cidadão requerente à liberdade.
TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DOS AÇORES
PRESIDÊNCIA
O juiz Presidente,
Pedro Soares de Albergaria
comunicado anexo referente ao assunto supra.